A agricultura e a independência alimentar do país

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Por Eurico José Marques dos Reis | Juiz Desembargador

Quero, à partida, deixar bem claro que de agricultura eu nada percebo.

Mas, por várias razões, essa é uma das matérias que me preocupa. Destaco aqui três dessas razões: a independência alimentar do país, a sustentabilidade dos solos agrícolas e a integração da actividade agrícola na chamada economia baseada no conhecimento.

Não sou nacionalista e abomino os nacionalismos que, tanto no passado como no presente, mais não são do que uma permanente fonte de conflitos insensatos e irracionais que já causaram mortandades e guerras devastadoras. Aliás, a gravidade e intensidade da maior parte dos problemas que afligem a Humanidade torna imperiosa e imprescindível a tomada de posições e a concretização das acções a uma escala global e não local.

E, no que respeita ao continente europeu, a existência da União Europeia é de uma indesmentível essencialidade não apenas porque, sendo a guerra, desde sempre, o "estado natural" da Europa, essa entidade supranacional e as Comunidades que a antecederam nos garantiram um duradouro período de paz como nunca tivemos desde a pax do Império Romano (e a paz é um elemento indispensável para tudo o resto possa existir), como também porque, em termos económicos, incluindo no que respeita à agricultura, só com a UE será possível competir com países de dimensões colossais como sejam a China e os EUA, mas também o Canadá ou a Austrália – para citar só os mais importantes.

Não obstante, até porque acho que nós portugueses, globalmente considerados, apesar dos nossos muitos defeitos (inveja e paralisante aversão ao risco e à mudança, por exemplo), temos algumas características únicas que nos distinguem dos demais povos (nomeadamente a nossa capacidade de adaptação e de improviso), penso que a nossa cultura merece ser preservada. Só que, para que uma cultura exista, têm que existir pessoas físicas que a pratiquem e transmitam e essas pessoas, para viver, precisam de estar alimentadas.

Ou seja, nestes tempos conturbados e perigosos, é necessário assegurar que o país tem capacidade produtiva no sector agrícola suficiente para garantir autonomamente uma quantidade de produtos alimentares suficientes para assegurar os patamares mínimos de satisfação das necessidades alimentares daqueles que habitam este jardim à beira mar plantado. E essa preocupação, que é sobremaneira um problema de Estado, tem de ser também uma preocupação de todos os membros da Comunidade.

O que nos remete para as outras duas questões que referi inicialmente e que, em minha opinião, estão interligadas de modo indissociável.

eurico reis

Eurico Reis

Houve tempos em que a população humana era nómada. Com essas deslocações, permitia-se o poisio das terras. Isso hoje não é possível. Por outro lado, como o passado já nos mostrou, a agricultura intensiva sem respeito pela terra e pelas suas características, provoca a exaustão dos solos.

Também aqui importa recordar que nenhuma geração (ou pessoa) é "dona" da terra/Terra e que, como diziam os índios americanos, nós somos apenas os guardiões da Terra em nome das gerações vindouras.

Eu não sei como (porém, há quem saiba) mas a sustentabilidade dos solos e a sua capacidade para produzir alimentos têm de ser asseguradas. Esse é mesmo um dos problemas essenciais dos nossos tempos. Enquanto ainda há tempo.

Ora, por muito respeito que nos mereça a sabedoria popular tão bem retratada na canção de Rui Veloso "A Gente não Lê" – e que eu tenho porque o "saber dos Antigos", como lhe chamava a minha querida avó materna, não sendo um conhecimento científico é um saber empírico/estatístico que representa a síntese das experiências acumuladas de muitas gerações de seres humanos -, a intervenção da ciência na agricultura é, a meu ver, absolutamente vital. Desde a análise dos solos e das suas características até à apresentação do produto final aos consumidores. Ou, para usar uma expressão antiga, de fio a pavio.

Vejo sinais de essa preocupação existe. Que assim seja é tudo o que posso desejar. Para bem de todos nós.

Nota: Artigo publicado na edição impressa da Agrotec 31.

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Fonte: Agrotec

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