É preciso dar dimensão ao agroalimentar

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Por Pedro Soares dos Santos

Presidente e Administrador-Delegado do Grupo Jerónimo Martins

Com o crescimento galopante da população a nível global num cenário de incerteza económica, elevado risco de alterações climáticas e desconfiança crescente face às questões de segurança alimentar, aumentar a produção de alimentos seguros e sustentáveis é um desafio que convoca todos os países, e também Portugal.

Muito longe vão já os tempos em que Portugal era, como em meados do século passado, um país essencialmente agrícola, com o sector a contribuir em cerca de 30% para o PIB e a empregar mais de 40% da população activa. Eram tempos de fixação e controlo governamental dos preços dos produtos agrícolas, no âmbito de um modelo de crescimento económico centrado no fomento e no proteccionismo industriais.

Quando, em 1986, o nosso país aderiu à então Comunidade Económica Europeia, o sector já representava apenas 5% do PIB e cerca de um quarto da população activa nacional. A aplicação da Política Agrícola Comum e das suas várias reformas traduziu-se em mais de 30 anos de políticas em grande medida erráticas e com resultados pouco consistentes. Hoje, e apesar do chamado “regresso à terra” a que parece ter-se vindo a assistir nos últimos anos, a verdade é que o sector primário vale apenas cerca de 2% do PIB e a maior parte da população activa portuguesa a ele dedicada está bastante envelhecida e é pouco qualificada.

É neste contexto que se torna promissor verificar que, pelas projecções da agência pública Cedefop no âmbito de um estudo sobre o mercado de trabalho de 28 países da União Europeia, mais de um quarto das oportunidades de emprego qualificado em Portugal até 2025 estão no sector primário.

É inegável que Portugal tem um problema de escala quer ao nível da dimensão das explorações agrícolas individuais quer ao nível da representatividade e força comercial dos agricultores junto dos operadores da distribuição.

A organização das estruturas de produção agrícola precisa de ser francamente repensada para entrar num novo patamar de dimensão. Sou da opinião que o sector primário português precisa de unir esforços e procurar sinergias se quer assegurar a sua produtividade e competitividade num mercado aberto e em que os consumidores são extremamente sensíveis ao preço dos produtos alimentares. E fazê-lo, gerindo mais eficientemente os recursos naturais e minimizando a degradação ambiental, através da adopção de práticas agrícolas mais ecológicas e sustentáveis.

No Grupo Jerónimo Martins, desenvolvemos um manual de agricultura sustentável, com princípios e metodologias que valorizamos ver aplicadas nas explorações dos parceiros a quem compramos os produtos que vendemos.

Só fazendo conjugar organização, produtividade, eficiência e sustentabilidade é que será possível continuar a fazer crescer as exportações, e também – e não menos importante – substituir importações.

O Pingo Doce, que compra em Portugal cerca de 85% dos produtos agrícolas que vende, tem vindo a desenvolver, com um conjunto seleccionado de parceiros, projectos estratégicos de substituição de importações, como é o caso, por exemplo, da produção nacional de borrego, que já consegue assegurar 100% das necessidades da nossa cadeia.

Acredito que o futuro da agricultura em Portugal passará também pela sua capacidade de acrescentar valor e diferenciação ao produto, beneficiando para isso também da evolução das tecnologias e do conhecimento disponível. Foi com este espírito que o Grupo Jerónimo Martins entrou recentemente no negócio da produção de carne bovina Angus portuguesa, em instalações que incorporam preocupações com a segurança e o bem-estar animal, bem como com os impactos ambientais decorrentes de uma actividade que é poluente.

Defendo que, com políticas públicas estratégicas, estáveis e consistentes – sem as quais é muito difícil, senão impossível, atrair investimento produtivo privado – Portugal poderá ambicionar ter uma balança comercial mais equilibrada no sector primário e uma muito maior auto-suficiência alimentar.

pedro

Nota: Este artigo foi publicado na edição n.º 23 da Revista Agrotec.

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